21/06/2021

EURO 2020 - GRUPO F - PORTUGAL 2-4 ALEMANHA - O PROBLEMA NÃO É PERDER COM A ALEMANHA, É COMO SE PERDE COM A ALEMANHA

 



Lembram-se do que falei sobre o jogo com a Hungria? Que o meio campo não permitia a Portugal furar, manter bola acima da sua defesa e que Fernando Santos mexeu bem para desbloquear esse problema e vencer o jogo? Pois bem, pareceu que o seleccionador achou que se resultou uma vez então podia resultar novamente, como se Alemanha e Hungria tivessem o mesmo tipo de jogo. A única semelhança entre germânicos e magiares foi mesmo o facto de jogar com três centrais, porque de resto nada mais havia em comum.

Mas isto foi quando se tentou solucionar o descalabro em que a Selecção se encontrou ao início da segunda parte do jogo. Antes disso, o processo defensivo que era a jóia da coroa do modelo implementado por Fernando Santos oxidou de tal maneira que os diamantes transformaram-se em plástico rasca, e toda a estrutura abanou como um castelo de cartas face a uma Alemanha de Low que, mais uma vez, estudou a selecção portuguesa, soube descobrir as suas lacunas e explorá-las até ao tutano.

Logo aos 5 minutos ficou evidente qual a estratégia da Alemanha para este jogo: como Portugal coloca muita gente na zona central tornando muito difícil a penetração, então era necessário desequilibrar as alas portuguesas. E isso foi feito de forma muito simples: a Alemanha saía com a bola pelos três centrais, chamando Bernardo (quase sempre) e Jota (às vezes) à pressão alta, conseguindo normalmente ganhar a superioridade numérica porque Ronaldo não vai desgastar-se nessa pressão e Bruno Fernandes estava a tentar controlar Kroos, enquanto Gundogan era tapado pelo William (ou Danilo). Neste momento já temos 5 jogadores portugueses agarrados, sendo que as deslocações de Havertz e Muller garantiam sempre a entrada da bola no eixo da frente da Alemanha. Isto colocava a defesa portuguesa mais o Danilo (ou o William) um para um com os alemães. Com as marcações homem a homem dos dois médios da Alemanha em vez de uma estratégia mais zonal, começava a destruição da barreira Portuguesa. 

O processo fez-se maioritariamente pelo lado direito, mas o mesmo ocorreu do lado esquerdo. No entanto, vou dar o exemplo que mais vezes aconteceu e que "queimou" Nelson Semedo aos olhos de quase toda a gente, incluindo eu. A partir do momento em que a bola entra em Muller, este puxa Raphael para o meio. Jota recua para auxiliar a defesa com Kimmich. Muller abre novamente na linha, Kroos e Gundogan aproximam-se para o lado direito do ataque, obrigando a selecção portuguesa a bascular toda para o seu lado esquerdo. Neste momento, Nelson Semedo já está a tremer pois não sabe o que há-de fazer. Bernardo foi à pressão aos centrais e ao GR Neuer e ainda está a regressar, Goosens está encostadinho na linha, mas Havertz está no meio perto de Gnabry, onde os centrais estão um para um, pois Danilo foi tentar tapar o lado esquerdo. 



É aí que, invariavelmente, Kimmich vira o jogo para Gosens, com precisão milimétrica, e o médio esquerdo a partir daí fez miséria da defesa portuguesa. A culpa não é de Nelson Semedo, mas de Fernando Santos e de como pôs Portugal a defender. Claro que depois do jogo acabado todos somos treinadores, mas eu vi Manuel José dizer que, assim que o Gosens marca o golo que foi anulado aos 5 minutos, comentou com os outros que estavam a ver o jogo com ele que o Danilo devia fazer de 3º central no processo defensivo, assegurando de forma zonal a tal defesa das movimentações de Gnabry e Havertz/Muller e assim expandir a linha defensiva portuguesa por forma a que os laterais pudessem segurar Kimmish e, principalmente Gosens. Bruno Fernandes baixaria para o lado de William e faria uma 2ª linha de 4 jogadores.

Fogo... estou um entendido nisto... Nada disso, limito-me a olhar para o jogo e ouvir quem sabe. Percebi durante o jogo que o que se estava a passar não era por culpa do Nelson Semedo, nem do Bernardo. Havia alí qualquer coisa de fundo que precisava de ser mudado, porque se o Bernardo vem também ele para trás, tal como vinha já o Jota... só fica lá o Ronaldo na frente? E como se saía desse sufoco?!?! Uma das respostas que faz sentido é, de facto, a de Manuel José: quando não se tinha bola, o Danilo ia para central, garantir a superioridade numérica naquela zona do terreno.

Mas isto era tudo muito giro se Portugal tivesse capacidade de manter a bola quando a recuperasse. E isso, Portugal só o consegue fazer contra a Hungria e outras selecções do mesmo nível. Há muito tempo que Portugal entrega a bola ao adversário, fecha-se em copas e aposta no contra-ataque, maioritariamente das vezes até sem critério, valendo-se no entanto da qualidade individual para concluir em golo esses momentos. Foi assim que ganhou o Euro 2016. Só que um raio não cai duas vezes no mesmo sítio, e muito menos três.

Na qualificação para o Mundial 2018, onde se inserem os jogos feitos na Taça das Confederações, e na fase de grupos da Liga das Nações, houve laivos de uma mudança de paradigma na Selecção, com William a fazer parceria com Ruben Neves, Pizzi (e depois Bruno Fernandes) e Bernardo Silva, numa frente de ataque que tinha André Silva, Gonçalo Guedes ou João Felix com Ronaldo. E aí, era conciliada a consistência defensiva com capacidade de posse de bola e critério quando era necessário construir. No entanto, com a chegada das fases finais, a ideia era abandonada e lá voltávamos ao mesmo.

O pior de tudo é que Fernando Santos anda apostado cada vez mais em substituir o talento com bola por características físicas. Quando Portugal precisa de posse de bola, o seleccionador retira quem melhor coordenou o ataque, Bernardo Silva, para meter o poço de força com passe curto que é Renato Sanches. A segunda opção é a de Rafa, velocidade pura. Jogadores como Ruben Neves, Moutinho e João Félix estão em muito maus lençóis.

O problema não foi perder com a Alemanha, mas a forma como se perdeu, e como se tem perdido outros jogos, como em casa com a França para a fase de grupos da Liga das Nações 2021. As selecções de Fernando Santos ganharam mas nunca entusiasmam nem dão confiança. Essa falta de confiança vê-se nos comentários e na forma como os diálogos se passam na TV: toda a gente faz contas ao terceiro lugar com 3 pontos, quando uma vitória frente à França nos coloca no mínimo em segundo lugar no grupo. E esse é que deveria ser, de facto, o foco do comentário.

1 comentário:

Daniel Ernesto Vitoria disse...

Totalmente de acordo...