15/02/2017

DIZ-ME, FRANCESCO: QUAL É O TEU SEGREDO?!



Todo o jogador, melhor ou pior, mais profissional ou mais amador, chega a uma fase da sua carreira em que se depara com novidades que lhe fazem confusão: que a bola já não rola como rolava antes, que os adversários ficam mais rápidos a mudar de direcção, que os jogos passam a durar mais tempo do que era normal... e depois percebe que nada disto é estranho, é apenas a idade a atacar. E quando ataca, meus caros, não há experiência que nos valha.

Para um jogador de "elite", como é o caso do personagem que vos escreve estas linhas, há também outros factores externos que nos condicionam a profissão. Esses factores são vários, diversos, mas descrevem-se numa simples expressão de duas palavras: vida familiar.

Pois bem, os últimos meses têm sido o reflexo do acordar para uma nova realidade. A quatro meses de completar 40 anos, dei comigo de canadianas pela primeira vez na vida devido a um estiramento do ligamento lateral interno do joelho esquerdo. Foi a primeira vez que fiquei sem jogar mais de um mês por obrigação. Foram dois meses e meio de paragem, e o regresso revelou-se doloroso, obrigando a mais umas semanas de paragem. 

A seguir, verifico que a minha profissão adorada colide com os interesses da pessoa que comanda o Mundo, a quem foram atribuídos poderes tais que lhe permitem interferir com os direitos adquiridos dos habitantes terrestres em geral e dos futebolistas em particular, e que é tão egoísta quanto qualquer ser humano pode ser. Para quem não percebeu aquilo a que me refiro, o meu puto mais novo aprendeu a andar, desatou a mexer em tudo o que alcança e implantou o Inferno na Terra. A mãe, já quase em estado de demência devido às torturas de que foi alvo, pediu-me por tudo que a ajudasse a conter os seus ímpetos ditatoriais e impedisse que o seu domínio se estendesse ao restante território. "Bolas, mas isso implica que terei de faltar aos jogos..."


A realidade é que a competição efectiva esmoreceu nos últimos anos. De campeonatos com duração de Outubro a Maio, o FLX passou a participar apenas em torneios com 10 a 14 semanas, e alguns eventos esporádicos de curta duração. Os treinos passaram a ser mais uma peladinha de amigos, e às tantas essa peladinha até foi substituída no seio da equipa por peladinhas com outros grupos. A última competição em que participámos foi a 4 de Março de 2016, o tal dia em que o meu joelho decidiu provar que efectivamente não é de ferro... Com a ascenção do Tirano-Mór, as próprias peladinhas ficaram para segundo plano.

Assim, aos 40 anos, dei por mim a pensar que aqueles momentos áureos, aquelas alegrias que conquistámos e que me fizeram de alguma forma viver o sonho de criança, estão mesmo a chegar ao fim. Que no futuro um jogo nunca será como os jogos de há uns anos, e o meu jogo, a minha capacidade de explosão, a minha força para ganhar em corrida ao adversário e bater o guarda-redes adversário com um "tiraço", cada vez será menor... 

E que a bola nos meus pés irá ter um comportamento diferente ao longo dos tempos. Até que um dia, um qualquer dia, irá mesmo deixar de tocar no meu pé...

Amanhã, regresso ao futsal. Peladinha de amigos, pura diversão cuja importância está cingida ao "picanço" na sala do café durante a semana que se sucede. O que tem de especial?! Incrivelmente, é o primeiro jogo que disputo no ano de 2017. Aliás, o primeiro jogo que disputo desde Novembro de 2016 e o sexto da época 2016/2017. E pensar que cheguei a treinar e jogar segunda, quarta, sexta, sábado e domingo...



Francesco Totti. 40 anos, dois meses mais novinho que eu. No passado dia 1, foi dele o golo que deu à Roma (o seu único clube) a passagem à fase seguinte da Taça de Itália. Mais um, o terceiro golo em 16 jogos entre Liga Italiana, Taça de Itália e Competições Europeias. 

Diz-me, Francesco: qual é o teu segredo?


PS: ponto positivo disto tudo é que quanto mais se aproxima o fim da bola, mais angustiado fico. E estando mais angustiado, mais motivos tenho para escrever aqui! Lá para os 65, é certinho: Prémio Nobel da Literatura!