29/09/2006

COMO SER UM CAMPEÃO SEM NUNCA O SER...

O público está ao rubro. De um lado, os nossos apoiantes, loucos por assistirem a uma oportunidade soberana da sua equipa para vencer a eliminatória. Do outro, os da equipa da casa, desejosos de vingar a eliminação de há uns anos, mas a vaiar quase unissonamente o árbitro por esta decisão... Está um ruído ensurdecedor no estádio, pois são 60.000, numa proporção de adeptos de 60-40, e acho que neste momento ninguém está calado. Ou grita "OLÉ OLÉ OLÉ" ou grita com o árbitro.

Por isto é que o desporto é um poço de emoção e uma das coisas mais belas que a humanidade criou. Estou certo que são momentos como este que estou a viver neste momento que criam os heróis! No fim, até podemos não chegar à final, mas esta eliminatória foi dramática! E daqui a uns anos, mesmo que nenhuma destas equipas tenha sido campeã, certamente falarão deste jogo e do homem que marcou o penalty vitorioso ou do guarda-redes que foi enorme na defesa!

Neste momento, só um nome me vem à cabeça: Gilles Villeneuve. É estranho... um jogador de futebol pensar num corredor de Fórmula 1. Mais estranho ainda pensar num corredor de Fórmula 1 que nunca ganhou nada! Quer dizer, nada... ganhou 6 corridas e teve uma série de segundos lugares... já não foi mau, né? Mas é particularmente simples dizer porque é que penso neste momento neste piloto...


Gilles Villeneuve chegou à F1 em 1976, onde guiou um McLaren durante umas corridas. No ano seguinte foi para a Ferrari e aí fez o resto da sua (curta) carreira. E foi uma das figuras do GP de França de 1979, em Dijon. Se perguntarem aos entusiastas ferranhos da F1 quem venceu esse GP, metade não saberá de cor, mas certamente saberão quem foi o 2º e o 3º: Gilles Villeneuve e Renés Arnoux. Porquê? Porque nas 3 últimas voltas, estes moços alternaram de posição 7 vezes, 5 delas na última de todas, numa série de ultrapassagens em que valia tudo, desde toques de rodas a ultrapassar pela relva! Fantástico! Uns meses mais tarde, em Watkins Glen nos EUA, na 6ª feira a chover a cântaros, Jody Sheckter tinha o melhor tempo numa pista quase impraticável. Impraticável... para os outros, pois Gilles foi para a pista e tirou ONZE SEGUNDOS ao tempo de Jody e ficou ele com a 1ª posição da grelha de partida provisoriamente.


O pai do campeão do mundo de 1997 (Jaques Villeneuve) é considerado um dos maiores pilotos de sempre da F1, sem no entanto ter ganho qualquer campeonato, mercê do seu modo especial de abordar as corridas. Gilles intitulava-se um corredor de automóveis, e que um corredor de automóveis não pode correr para os pontos, mas sim para deixar todos os outros adversários atrás de sí. Se está num GP para os pontos, não é um corredor mas sim um condutor de carros de corrida. Por causa deste seu feitio, fez coisas inimagináveis mas ficou também muitas vezes pelo caminho. E em Zolder, a 8 de Maio
de 1982 no GP da Bélgica, ficou de vez pelo caminho.


15 dias antes, Gilles e Didier Pironi, seu companheiro de equipa, seguiam calmamente para o final da corrida na primeira e segunda posições respectivamente, com ordens para pouparem combustível e com um acordo de cavalheiros entre os dois e o manager da Ferrari de que manteriam a ordem de posições nas últimas 10 voltas. Só que Pironi, numa manobra à cão, ultrapassa Villeneuve na última volta a 5 curvas da meta, e depois fechou-se todo na frente e acabou por vencer, quebrando o tal acordo e deixando Villeneuve piurso que nem um bacalhau na altura em que descobre que aquela taínha o levou para o meio da rede de um arrastão. Daí ter sentido a necessidade de provar (????) que era melhor, que merecia mais, que Pironi lhe devia respeito. Daí ter-se atirado à pista e puxado pelos limites do seu carro. E com os pneus já degradados mas ainda com a esperança de fazer melhor tempo que Pironi (que tinha sido mais rápido que ele em um décimo de segundo), deparou-se com o March de Jochen Mass a andar muito lentamente. Mass desviou-se para a direita para deixar Villeneuve passar por dentro da curva, só que Villenenuve também foi para a direita, com o objectivo de ultrapassá-lo por fora. O resto resume-se a um carro vermelho em vôo durante 200 metros e a desfazer-se em mil pedaços pouco depois.

Gilles é um campeão sem nunca o ter sido. Está num patamar igual ao de Senna e outros que faziam coisas impossíveis com carros que, comparados com outros, eram autênticas carroças. Demonstrou que a vida de um desportista é feita de momentos sublimes. Por isso, acho que vou marcar este penalty com o calcanhar...

2 comentários:

iksykovfed disse...

Marca "de letra" como os outros ...

Melody disse...

A isto se chama, ter um neuróneo no burro e outro no cigano!
Grande viragem, sim senhora.
Começa no futebol e tal piloto de fórmula I, revira o malho.
Oh Strik3r,já agora os adeptos não gritavam pela mãe do árbito?
Olha lá, não nos enganes tá?