Chegou
o dia. 27 de Junho de 2012 pode vir a ser um dia normal ou então mais
um numa nova página brilhante e bem reluzente no livro de memórias do
desporto português.
Tenho quase 36 anos, nasci um mês depois da
histórica final do Europeu de 1976, o dia em que o Panenka deixou o seu
nome para sempre na história do futebol mundial, com aquele penalti
atrevido que ainda no domingo o Andrea Pirlo imitou. No dia em que
nasci, a Selecção Portuguesa tinha participado até aí brilhante e
unicamente no Mundial de 1966.
A primeira competição da qual
tenho alguma consciência de ter assistido foi o Mundial de Espanha de
1982. Estava prestes a fazer 6 anos, era quase um bebé, mas lembro-me de
estar a torcer com o meu pai pela França de Platini contra a Alemanha
de Gerd Muller e Rummenigge. Lembro-me como se fosse ontem do Harald
Schummacher mandar o recém-entrado Batiston para o hospital com uma
entrada assassina, à qual nem falta foi marcada (era penalti), de gozar o
resto do tempo com os adeptos franceses, de a França chegar a estar a
ganhar por 3-1 no prolongamento, de o Rummenigge e o Muller marcarem
dois golos e levarem a decisão para os penaltis, e de o futebol ser
madrasto e injusto para com os franceses nesse dia.
Eram os
tempos em que os Portugueses torciam pelo Brasil nos Mundiais, porque
apesar de os clubes irem fazendo uns brilharetes nas competições
europeias, a Selecção Nacional não saía da cepa torta. Até que chega o
Europeu 1984. Tinha 7 anos, prestes a fazer 8, e recordo principalmente
do golo do Sousa à Espanha e, obviamente, do primeiro jogo que um dia me
fez sonhar: o França-Portugal. Lembro-me de termos ficado presos no
trânsito ou algo assim e que por essa razão quando o meu pai ligou a TV,
estava a dar a repetição do golo da França. Depois, foi assistir ao
Bento a defender que nem um maluco, o Chalana a partir os rins aos
defesas franceses e dos golos do Jordão. Lembro-me de andar a tentar
imitar a celebração dos golos do nº 3 da Selecção no Euro 84 (faz
lembrar alguma coisa?). E que golaço foi aquele golo no prolongamento. E
lembro-me de durante meses não poder ouvir falar no nome do Nené,
porque falhou um golo feito que nos dava o 3-1 e que por isso tínhamos
perdido.
Depois veio 1986, depois do célebre golo do Carlão ao
malandro do Harald Schumacher nos dar um apuramento sofrido e
inesperado. E veio a desilusão de ver a Selecção vencer os fortíssimos e
candidatos ingleses com Peter Shilton, Glen Hoddle, Gary Lineker, Chris
Waddle, Brian Robson e Peter Beardley, e perder com uma Polónia vulgar e
com um incrível Marrocos, isto depois de greves aos treinos
relacionadas com prémios de jogo, no que ficou celebrizado como o caso
Saltillo. Sendo o Mundial jogado com 24 equipas, eram apurados para os
1/8 de final os dois primeiros classificados de cada um dos 6 grupos e
os quatro melhores terceiros classificados. Senti uma vergonha enorme
por Portugal ter sido o único do nosso grupo a ser eliminado,
principalmente por causa de perceber já naquela altura que foi por
mesquinhices que os jogadores não trabalharam como deviam...
E
aí começou nova travessia no deserto em termos de apuramentos, em tudo
idênticos a situações anteriores a 1984: grandes resultados contra as
equipas melhores e depois empates e derrotas com Malta, Luxemburgo e
outros que tais... Nos anos 90 surge a Geração de Ouro, que nos dá a
primeira felicidade em 1995, ao apurar-se para o Euro-1996 em
Inglaterra. Em 1998, graças ao Batta, tive de torcer pela fantástica
Croácia. Depois, em Novembro de 1999, em mais um apuramento impróprio
para cardíacos, o Abel Xavier marcou o golo que abriu as portas para
estarmos na Bélgica e na Holanda. E já vão 12 anos seguidos de
apuramentos.
Escrevo-vos esta mensagem como um velho. Um velho
de 36 anos que está mostrar a adultos de 20 anos que tempos houve em que
ano após ano ficávamos a ver os outros a jogar, e que esse tempo não
foi assim tão longíncuo como isso. Se até 1984 a minha noção de futebol
era muito fraca, daí para cá acompanhei ao pormenor todas as competições
de selecções e acreditem que se aos 18 anos, em pleno Mundial 1994, me
dissessem "daqui a 12 anos, Portugal estará novamente na meia-final de
um Campeonato do Mundo, como nos tempos do Eusébio" eu diria que esse
tipo era parvo. As emoções que a Selecção me fez viver daí para cá eram
completamente inesperadas.
É por isso que eu hoje estou
contente e satisfeito com esta Selecção. Mas acima de tudo estou
confiante. Faltam poucas horas para o início de um jogo que estou com
uma confiança tão grande como em 2004, quando enfrentámos os mesmos
espanhóis. Confiança que não tinha em 2010, confiança que raras vezes
tenho. Esta equipa e este seleccionador dão-me uma confiança como nem o
melhor Scolari e seus "meninos" me deram.
Independentemente do
que acontecer logo, estou orgulhoso deste grupo, deste Ronaldo que
tantas vezes apelidei de mimado e egocêntrico, que jogou anos a fio na
Selecção ao estilo "eu sou o bom" e que hoje em dia joga ao estilo "nós
somos bons", deste treinador que foi muitas vezes contestado e
achincalhado aquando do seu periodo no Sporting, mas que se mostrou
competente, forte e verdadeiro líder! Podemos perder com Espanha, mas se
tal acontecer de certeza que perderemos com honra.
Mas estou
plenamente convicto que vamos ganhar, porque não gosto do jogo desta
Espanha e porque o trabalho de casa do Paulo Bento é sempre bem feito! E
porque é justo que um grupo de "jogadores de refugo depois de uma
Geração de Ouro", como foram apelidados pelos entendidos em futebol na
televisão e na rádio, tenha a oportunidade de demonstrar de facto aquilo
que são: uns campeões! Sinto uma garra tremenda em campo, temos um jogo
que "dá pica" de assistir e acima de tudo não há medo!!!
Hoje o jogo é nosso!!!